quarta-feira, 3 de agosto de 2022

 


Por Donato Macedo

 

O auto-definhamento informativo.

 



O panorama informativo da Região está há muito tempo “adormecido” (as aspas são intencionais, pois, a verdade requereria um termo mais cru), com evidente perda de qualidade prestada aos seus consumidores.

Há uns anos atrás, os dois principais títulos diários regionais, digladiavam-se um em frente ao outro na Rua Fernão de Ornelas. Um, por detrás das beatas vestes e odor a incenso, era alimentado por todos nós, o outro, o antigo “diário dos ingleses” atuava como uma espécie de contrapoder, com uma áurea de maior isenção, à medida que ia conhecendo dificuldades crescentes na hostilidade por parte do poder regional de então, assim como, uma cada vez maior exiguidade de publicidade pública nas suas páginas. Em setembro de 2011, vários ativistas acantonaram-se no interior do JM, em protesto com a linha editorial daquele jornal, que sustentado pelos contribuintes, era uma espécie de "Pravda" do regime de Alberto João Jardim, criando um facto mediatizado de dimensão nacional. Muitos desses arrojados elementos, fizeram a cama para que os "cafofos" desta vida se deitassem no divã com mel, uvas e demais luxúrias, desalojando quem lhes preparou e confiou o estaminé.




Ainda em finais da primeira década deste século, a cúpula do poder proibiu militantes do PSD de escorrer opinião nas páginas do Diário de Notícias. Houve inclusivamente um jovem imberbe militante, que pingava acne por onde passava, em que num gangue pueril em plena campanha, jurou no seio duma manada acéfala onde cobardemente se escudava, “morte e fogo” ao Diário de Notícias. Quis o destino que anos mais tarde, esse mesmo espírito disforme saísse escorraçado, sem honra nem glória, a “ranhar do focinho” em "prime-time" televisivo, reclamando o colo do seu endeusado guru.

Mas, apesar de toda essa ambiência, havia alguma pulsão em trazer a público parte do que era varrido para debaixo do tapete.

O jornalismo tal como outras áreas tem vindo a sofrer um “emagrecimento” com a aridez crescente das redações, com a exiguidade do mercado publicitário, bem como com as mudanças de mãos das suas estruturas acionistas. Se a informação é poder, nos ecossistemas pequenos como o nosso, aqui mais se verifica. A viabilidade económica pode ser reduzida, mas estrategicamente, é sempre uma vantagem ter a informação sob a trela. Não se pense que o problema é apanágio da Madeira. O panorama nacional não é melhor, e nem assim há tanto tempo, uma relevante parte da comunicação social nacional, deixou-se, tal como outros setores de atividade, instrumentalizar-se como uma lavandaria de dinheiro oriundo da cleptocracia angolana.
Neste momento, os dois principais jornais diários da região, têm na sua estrutura um mesmo grupo empresarial, com o pé nos dois títulos. Tal como outro grupo, com interesse nos média, que ao “desinglesar” a participação nesse título, tem dois destacados quadros técnicos, quer na liderança da oposição, como num destacado lugar na maior autarquia da Madeira. Um pé em cada lado, é estratégico. As convicções há sempre quem as tenha.

Tomemos por exemplo a um caso concreto já há uns anos ocorrido:

  • Alguém imagina hoje ser possível acontecer uma investigação jornalística como a que ocorreu há uns anos atrás (2009), pelo DN na Ribeira do Faial a um estaleiro do grupo AFA que poluía o ambiente, e os jornalistas serem corridos e ameaçados à pedrada por funcionários da empresa até partir o para-brisas do automóvel que transportava os repórteres?

in ® DN-Madeira 18/03/2009


  • Ou por exemplo, o DN relatar a ocorrência de algum saque de inertes numa qualquer ribeira?




in ® DN-Madeira 22/03/2020


  • Ou relatar o impacto de algum futuro colosso volumétrico como o Savoy Palace, emparedando a majestosa Avenida do Infante?




in ® DN-Madeira 07/07/2017


Assiste-se há anos à transumância de jornalistas da redação de jornais, rádios e até da televisão, para gabinetes de comunicação, quer ao serviço do poder e do universo empresarial público. O corredor é igualmente fluido para a dita oposição da “alternativa” sem qualquer eufemismo anestésico. Há até exemplos de verdadeiros mercenários da comunicação que já serviram no mesmo cargo, distintas equipas autárquicas, com a necessária cambalhota digna de medalha olímpica. São os "Ben's" da vida airada, bem entendido...





Vejamos o que sucede na RTP-Madeira: A perpetuação dos cargos altivos no canal público da Levada do Cavalo, bem como a resistência à renovação dos seus quadros; atente-se à sublime “conversa de café” dum Dossier de Imprensa feito em circuito interno, onde os mesmos protagonistas de forma corporativa, retemperam conteúdos pseudoinformativos, moderados por uma entidade mais omnipresente que o Espírito Santo. E não raras vezes, os “convidados” corporativos posicionam-se na rampa de lançamento para as assessorias públicas…Estaremos condenados a pagar também isso na conta da luz?

Muitos profissionais desta área para explicar as agruras da profissão, culpam o advento das redes sociais, com a acusação do alfa e ómega diabólicos, da desinformação reinante. Será mesmo que é só isso, que uma introspeção mais atenta revela, quando não raras as vezes, as próprias redes sociais são por muitos deles, a fonte de informação sem "fact-check"? Mas, mais. Quantas vezes os jornalistas prestam-se a ser meros pés-de-microfone ao débito político, sem questionar, e sem contrapor? Quantos textos e áudios são apenas reproduzidos ipsis verbis para a veiculação de uma informação que se supõe verosímil depois de validada e depurada pelo tempero da imparcialidade?





in ® DN-Madeira 22/10/2010



Recordo que há apenas uns anos atrás, vários jornalistas, políticos e aspirantes a políticos foram aliciados por uma editora que ancorou-se no Centro Internacional de Negócios da Madeira, como fachada de negócios oriundos no norte de Itália, e que entre outras atividades, como ser um "viveiro de socialistas na incubadora", organizava um malogrado e sumptuoso festival literário, que mais não era do que o exercício de planeamento fiscal, que foi objeto de diligências judiciais levadas a cabo na Madeira, a pedido das autoridades fiscais italianas.

Dobro-me perante a memória do desaparecido jornalista madeirense Tolentino de Nóbrega que na altura trabalhava para o jornal "Público", e que foi dos poucos profissionais, que trouxe a lume, os detalhes dessa operação judicial italiana denominada "Flying Money" que desmascarou este mecenato cultural que se alojou no meio do Atlântico e que muito boa gente daqui, provincianamente se embasbacou. Outros, porém, mantêm-se e sempre se mantiveram caladinhos, porque lhes publicaram uns escritos que de outra maneira, não lhes conheciam luz do dia...

Veremos se melhores dias virão.



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